Um pouco sobre Meditação

São incontáveis os estudos mostrando benefício das várias técnicas de meditação para a saúde humana – seja prevenindo ou aliviando doenças, tanto físicas quanto mentais. Para se ter uma ideia do volume de pesquisas e publicações disponíveis, realizamos no momento da publicação deste artigo uma busca pelo termo “meditation” no Google Scholar, plataforma da gigante de buscas voltada para publicações científicas / acadêmicas, que resultou em 1.030.000 resultados.

Existem inúmeras técnicas de meditação, algumas tão antigas quanto as religiões mais antigas, outras desenvolvidas mais recentemente, mas como trata-se de um assunto estudado por milênios antes do pensamento científico moderno surgir, em geral estas técnicas modernas são somente novas roupagens para as clássicas, não existindo muito espaço para ineditismo real.

A técnica mais difundida na atualidade é chamada Mindfulness (ou Atenção Plena em português), sendo anteriormente bastante popular a chamada Meditação Transcendental, ambas oferecendo programas comerciais de treinamento e até especialização, voltadas para indivíduos e grupos, incluindo organizações e corporações.

A técnica da Atenção Plena foi divulgada no meio acadêmico por Jon Kabat-Zin da Universidade de Massachusetts no final da década de 1970 originalmente através de um programa de oito semanas desenvolvido para portadores de dor crônica (“Mindfulness-Based Stress Reduction” ou em português Redução do Estresse baseado na Atenção Plena). Influenciado pelo contato daquele autor com práticas zen-budistas, o autor repetidas vezes declarou de forma irreverente que descrever a meditação como uma prática budista seria como dizer que a gravidade é inglesa, já que foi descrita por Isaac Newton.  Incluem a atenção plena no momento presente como denominador comum de variadas técnicas menores. Uma busca pelo termo “mindfulness” no Google Scholar encontrou no momento da publicação deste artigo 448.000 resultados.

A Meditação Transcendental foi divulgada no mundo ocidental por Maharishi Mahesh Yogi no final da década de 1960, um guru indiano da tradição védica que conseguiu popularizar a técnica inicialmente através de celebridades da cultura pop da época. Trata-se de uma técnica que utiliza a repetição de determinados sons primitivos (“mantras”) como forma de alterar a consciência com benefícios físicos e mentais. A busca pelo termo “transcendental meditation” no Google Scholar resultou em 101.000 resultados no momento da publicação deste artigo.

Nosso primeiro contato com a Meditação se deu nos treinos de Artes Marciais japonesas ainda na infância. Ao início e final de cada treino faziam parte do ritual de saudações o chamado “mokuso”, ocasião em que os praticantes, ajoelhados, eram então orientados fechar os olhos e tentar esvaziar suas mentes. Trata-se de evidente influência do Zen japonês pós-revolução Meiji, quando o que antes eram consideradas somente técnicas de guerra (“jitsu”) foram transformadas em caminhos espirituais marciais (“do”).

Por interesse inicialmente pessoal e posteriormente clínico e científico, viemos estudar e tomar contato com inúmeras práticas, vindo a descobrir que alguma forma de meditação é encontrada em todas as Religiões, não somente nas Orientais. É certo que no caso destas últimas é considerada muitas vezes uma prática religiosa central / fundamental, mas como diz um ditado de Autor desconhecido “orar é falar com Deus, meditar é escutá-lo”, sendo diversos os relatos bíblicos de meditação em oração, muitas vezes com o jejum associado, inclusive pelo Filho de Deus. O Cristianismo em seus primeiros séculos teve nos Padres do Deserto, p.ex., figuras que através do isolamento, contemplação, oração e jejum buscavam aproximar-se de Deus.

Tendo facilitado no passado grupos de prática em Dojos de Artes Marciais, parques públicos, clubes e academias esportivas e em diversas instituições de Saúde Mental, acumulamos experiência no treinamento e instrução da meditação, sendo rotineiramente sugerida aos nossos pacientes como medida complementar – nossa prática clínica permitiu confirmar os achados científicos de inúmeros benefícios para a saúde mental no geral.

Praticantes regulares conseguem alívio significativo dos sintomas depressivos e ansiosos bem como melhor estabilização do humor após poucas semanas de treinamento. Mesmo alguns pacientes portadores de síndromes psicóticas demonstraram melhora da tolerância às alterações de sensopercepção características.

Além desses achados clínicos específicos, o relato subjetivo de melhora da disposição, atenção e cognição no geral, com percepção mais acurada das emoções e diminuição de conflitos interpessoais é algo recorrente.

A prática da meditação, quando entendida como um tratamento adjunto para portadores de qualquer sofrimento psíquico, pode trazer resultados muito rápidos, mas entendemos serem necessárias ao menos 4 semanas com 3 práticas por semana para qualquer resposta sustentada. Se ao neófito parecer um esforço muito grande, esclarecemos que a duração de cada sessão de meditação em geral não ultrapassa 20 minutos somente – sendo que nas primeiras sessões sugere-se não mais que 5 minutos de duração.

Encontrar a técnica específica que melhor se adapte ao funcionamento mental do indivíduo é fundamental para a manutenção da prática pelo tempo suficiente para que seus benefícios possam ser percebidos.

Citamos neste artigo de forma bastante resumida as duas roupagens modernas de técnicas antigas mais difundidas, uma empregando a atenção no momento presente e a outra com foco na repetição de um som primitivo específico.

Mas existem inúmeras técnicas diferentes e de fácil aprendizado.

Ainda que alguns traços de personalidade ou mesmo sintomas psiquiátricos propriamente possam indicar maior benefício ou sugerir maior facilidade para técnicas específicas, somente a experimentação prática direta com algumas delas poderá determinar qual o melhor regime de treinamento para cada indivíduo.

Nos próximos artigos buscaremos oferecer um olhar crítico sobre as evidências científicas disponíveis, seja sobre os mecanismos psicobiológicos envolvidos, seja sobre os benefícios de fato já demonstrados em termos de saúde, além de descrever as principais técnicas, incluindo não somente instruções básicas para o iniciante, mas buscando oferecer também elementos de interesse que enriqueçam o repertório e conhecimento do praticante avançado e de instrutores.

Leia agora: Técnica Básica de Meditação – Atenção Plena na Respiração