Adicção / Dependência Química – Diagnóstico – DSM-V

Apresentamos o texto completo com a definição clínica e critérios diagnósticos para Adicção / Dependência Química de acordo com o DSM-5, que utiliza a nomenclatura Transtornos Relacionados a Substâncias e Transtorno Aditivos.

O DSM-5 elenca critérios diagnósticos específicos para cada substância psicoativa utilizada, que você poderá conhecer em outros posts no portal – iniciamos a exposição com os Critérios Diagnósticos para Transtorno por Uso de Álcool como texto base para a compreensão dos critérios diagnósticos para dependência química / adicção em geral.

Amplie seu estudo – leia o post com o texto completo com a definição clínica e critérios diagnósticos para dependência química da CID10.

Aprofunde seu estudo – confira neste link os critérios diagnósticos da versão anterior do manual da Associação de Psiquiatria Americana (DSM-IV), que esteve em vigor até meados de 2012.

Aprofunde seu estudo(2) – neste artigo o resumo de apresentação de Mesa Redonda no Congresso Latinoamericano de Análise e Modificação do Comportamento (CLAMOC) daquele ano sobre as mudanças que seriam propostas pelo DSM-V para um panorama da evolução do conceito e diagnóstico de adicção pela Associação de Psiquiatria Americana.

Finalmente neste link artigo sobre o Tratamento da Adicção.

Critérios Diagnósticos

(apresentamos os critérios diagnósticos para Transtorno por Uso de Álcool como texto-base, já que no DSM-5 são especificados critérios diagnósticos específicos para cada uma das substâncias psicoativas SPA)

A. Um padrão problemático de uso de álcool, levando a comprometimento ou sofrimento clinicamente significativos, manifestado por pelo menos dois dos seguintes critérios, ocorrendo durante um período de 12 meses:

  1. Álcool é frequentemente consumido em maiores quantidades ou por um período mais longo do que o pretendido.
  2. Existe um desejo persistente ou esforços malsucedidos no sentido de reduzir ou controlar o uso de álcool.
  3. Muito tempo é gasto em atividades necessárias para a obtenção de álcool, na utilização de álcool ou na recuperação de seus efeitos.
  4. Fissura ou um forte desejo ou necessidade de usar álcool.
  5. Uso recorrente de álcool, resultando no fracasso em desempenhar papéis importantes no trabalho, na escola ou em casa.
  6. Uso continuado de álcool, apesar de problemas sociais ou interpessoais persistentes ou recorrentes causados ou exacerbados por seus efeitos.
  7. Importantes atividades sociais, profissionais ou recreacionais são abandonadas ou reduzidas em virtude do uso de álcool.
  8. Uso recorrente de álcool em situações nas quais isso representa perigo para a integridade física.
  9. O uso de álcool é mantido apesar da consciência de ter um problema físico ou psicológico persistente ou recorrente que tende a ser causado ou exacerbado pelo álcool.
  10. Tolerância, definida por qualquer um dos seguintes aspectos:
    a. Necessidade de quantidades progressivamente maiores de álcool para alcançar a intoxicação ou o efeito desejado.
    b. Efeito acentuadamente menor com o uso continuado da mesma quantidade de álcool.
  11. Abstinência, manifestada por qualquer um dos seguintes aspectos:
    a. Síndrome de abstinência característica de álcool (consultar os Critérios A e B do conjunto de critérios para abstinência de álcool, p. 499-500).
    b. Álcool (ou uma substância estreitamente relacionada, como benzodiazepínicos) é consumido para aliviar ou evitar os sintomas de abstinência.

Especificar se:
Em remissão inicial: Após todos os critérios para transtorno por uso de álcool terem sido preenchidos anteriormente, nenhum dos critérios para transtorno por uso de álcool foi preenchido durante um período mínimo de três meses, porém inferior a 12 meses (com exceção de que o Critério A4, “Fissura ou um forte desejo ou necessidade de usar álcool”, ainda pode ocorrer).
Em remissão sustentada: Após todos os critérios para transtorno por uso de álcool terem sido satisfeitos anteriormente, nenhum dos critérios para transtorno por uso de álcool foi satisfeito em qualquer momento durante um período igual ou superior a 12 meses (com exceção de que o Critério A4, “Fissura ou um forte desejo ou necessidade de usar álcool”, ainda pode ocorrer).
Especificar se:
Em ambiente protegido: Este especificador adicional é usado se o indivíduo se encontra em um ambiente no qual o acesso a álcool é restrito.

Especificar a gravidade atual:
305.00 (F10.10) Leve: Presença de 2 ou 3 sintomas.
303.90 (F10.20) Moderada: Presença de 4 ou 5 sintomas.
303.90 (F10.20) Grave: Presença de 6 ou mais sintomas.

Transtornos Relacionados a Substâncias e Transtornos Aditivos

Introdução

Os transtornos relacionados a substâncias abrangem 10 classes distintas de drogas: álcool; cafeína; Cannabis; alucinógenos (com categorias distintas para fenciclidina [ou arilciclo-hexilaminas de ação similar] e outros alucinógenos); inalantes; opioides; sedativos, hipnóticos e ansiolíticos; estimulantes (substâncias tipo anfetamina, cocaína e outros estimulantes); tabaco; e outras substâncias (ou substâncias desconhecidas). Essas 10 classes não são totalmente distintas.

Todas as drogas que são consumidas em excesso têm em comum a ativação direta do sistema de recompensa do cérebro, o qual está envolvido no reforço de comportamentos e na produção de memórias. A ativação do sistema de recompensa é intensa a ponto de fazer atividades normais serem negligenciadas. Em vez de atingir a ativação do sistema de recompensa por meio de comportamentos adaptativos, as drogas de abuso ativam diretamente as vias de recompensa. Os mecanismos farmacológicos pelos quais cada classe de drogas produz recompensa são diferentes,
mas elas geralmente ativam o sistema e produzem sensações de prazer, frequentemente denominadas de “barato” ou “viagem”. Além disso, indivíduos com baixo nível de autocontrole, o que pode ser reflexo de deficiências nos mecanismos cerebrais de inibição, podem ser particularmente predispostos a desenvolver transtornos por uso de substância, sugerindo que, no caso de determinadas pessoas, a origem dos transtornos por uso de substância pode ser observada em seus comportamentos muito antes do início do uso atual de substância propriamente dito.

Além dos transtornos relacionados a substâncias, este capítulo também inclui o transtorno do jogo, o que reflete as evidências de que os comportamentos de jogo ativam sistemas de recompensa semelhantes aos ativados por drogas de abuso e produzem alguns sintomas comportamentais que podem ser comparados aos produzidos pelos transtornos por uso de substância. Outros padrões comportamentais de excesso, como jogo pela internet, também foram descritos, mas as pesquisas sobre esta e outras síndromes comportamentais são menos claras. Portanto, grupos de comportamentos repetitivos, por vezes denominados adições comportamentais, com subcategorias como “adição
sexual”, “adição por exercício” ou “adição por compras”, não estão inclusos porque, até o momento, não há evidências suficientes revisadas por pares para estabelecer os critérios diagnósticos e as descrições de curso necessários para identificar tais comportamentos como transtornos mentais.

Os transtornos relacionados a substâncias dividem-se em dois grupos: transtornos por uso de substância e transtornos induzidos por substância. As condições a seguir podem ser classificadas como induzidas por substância: intoxicação, abstinência e outros transtornos mentais induzidos por substância/medicamento (transtornos psicóticos, transtorno bipolar e transtornos relacionados, transtornos depressivos, transtornos de ansiedade, transtorno obsessivo-compulsivo e transtornos relacionados, transtornos do sono, disfunções sexuais, delirium e transtornos neurocognitivos).

Esta seção começa com uma abordagem geral dos conjuntos de critérios para transtorno por uso de substância, intoxicação por substância e abstinência de substância e outros transtornos mentais induzidos por substância/medicamento, sendo que alguns desses critérios se aplicam às classes de substâncias. O restante do capítulo reflete as particularidades das 10 classes de substâncias e está organizado por classe de substância, descrevendo os aspectos singulares de cada uma delas. A fim de facilitar o diagnóstico diferencial, o texto e os critérios dos transtornos mentais induzidos por substância/medicamento remanescentes localizam-se junto aos transtornos com os quais compartilham fenomenologia (p. ex., transtorno depressivo induzido por substância/ medicamento consta no capítulo “Transtornos Depressivos”).

Características

A característica essencial de um transtorno por uso de substâncias consiste na presença de um agrupamento de sintomas cognitivos, comportamentais e fisiológicos indicando o uso contínuo pelo indivíduo apesar de problemas significativos relacionados à substância. Como se observa na Tabela 1, o diagnóstico de um transtorno por uso de substância pode se aplicar a todas as 10 classes inclusas neste capítulo, com exceção da cafeína. Para determinadas classes, alguns sintomas são menos salientes e, em uns poucos casos, nem todos os sintomas se manifestam (p. ex., não se especificam sintomas de abstinência para transtorno por uso de fenciclidina, transtorno por uso de outros alucinógenos nem transtorno por uso de inalantes).

Uma característica importante dos transtornos por uso de substâncias é uma alteração básica nos circuitos cerebrais que pode persistir após a desintoxicação, especialmente em indivíduos com transtornos graves. Os efeitos comportamentais dessas alterações cerebrais podem ser exibidos nas recaídas constantes e na fissura intensa por drogas quando os indivíduos são expostos a estímulos relacionados a elas. Uma abordagem de longo prazo pode ser vantajosa para o tratamento desses efeitos persistentes da droga.

De modo geral, o diagnóstico de um transtorno por uso de substância baseia-se em um padrão patológico de comportamentos relacionados ao seu uso. Para auxiliar a organização, pode-se considerar que as condições sob “Critério A” encaixam-se nos agrupamentos gerais de baixo controle, deterioração social, uso arriscado e critérios farmacológicos. O baixo controle sobre o uso da substância é o primeiro grupo de critérios (Critérios 1-4). O indivíduo pode consumir a substância em quantidades maiores ou ao longo de um período maior de tempo do que pretendido originalmente (Critério 1). O indivíduo pode expressar um desejo persistente de reduzir ou regular o uso da substância e pode relatar vários esforços malsucedidos para diminuir ou descontinuar o uso Critério 2). O indivíduo pode gastar muito tempo para obter a substância, usá-la ou recuperar-se de seus efeitos (Critério 3). Em alguns casos de transtornos mais graves por uso de substância, praticamente todas as atividades diárias do indivíduo giram em torno da substância. A fissura (Critério 4) se manifesta por meio de um desejo ou necessidade intensos de usar a droga que podem ocorrer a qualquer momento, mas com maior probabilidade quando em um ambiente onde a droga foi obtida ou usada anteriormente. Demonstrou-se também que a fissura envolve condicionamento clássico e está associada à ativação de estruturas específicas de recompensa no cérebro. Investiga-se a fissura ao perguntar se alguma vez o indivíduo teve uma forte necessidade de consumir a droga a ponto de não conseguir pensar em mais nada. A fissura atual costuma ser usada como medida de resultado do tratamento porque pode ser um sinal de recaída iminente.

O prejuízo social é o segundo grupo de critérios (Critérios 5-7). O uso recorrente de substâncias pode resultar no fracasso em cumprir as principais obrigações no trabalho, na escola ou no lar (Critério 5). O indivíduo pode continuar o uso da substância apesar de apresentar problemas sociais ou interpessoais persistentes ou recorrentes causados ou exacerbados por seus efeitos (Critério 6). Atividades importantes de natureza social, profissional ou recreativa podem ser abandonadas ou reduzidas devido ao uso da substância (Critério 7). O indivíduo pode afastar-se de atividades em família ou passatempos a fim de usar a substância.

O uso arriscado da substância é o terceiro grupo de critérios (Critérios 8 e 9). Pode tomar a forma de uso recorrente da substância em situações que envolvem risco à integridade física (Critério 8). O indivíduo pode continuar o uso apesar de estar ciente de apresentar um problema físico ou psicológico persistente ou recorrente que provavelmente foi causado ou exacerbado pela substância (Critério 9). A questão fundamental na avaliação desse critério não é a existência do
problema, e sim o fracasso do indivíduo em abster-se do uso da substância apesar da dificuldade que ela está causando.

Os critérios farmacológicos são o grupo final (Critérios 10 e 11). A tolerância (Critério 10) é sinalizada quando uma dose acentuadamente maior da substância é necessária para obter o efeito desejado ou quando um efeito acentuadamente reduzido é obtido após o consumo da dose habitual. O grau em que a tolerância se desenvolve apresenta grande variação de um indivíduo para outro, assim como de uma substância para outra, e pode envolver uma variedade de efeitos sobre o sistema nervoso central. Por exemplo, tolerância a depressão respiratória e tolerância a sedação e coordenação motora podem se desenvolver em ritmos diferentes, dependendo da substância. A tolerância pode ser difícil de determinar apenas pela história, e testes de laboratório podem ser úteis (p. ex., níveis elevados da substância no sangue com poucas evidências de intoxicação sugerem boa chance de tolerância). A tolerância também deve ser diferenciada da variação individual na sensibilidade inicial aos efeitos de substâncias específicas. Por exemplo,
algumas pessoas que consomem álcool pela primeira vez apresentam pouquíssimas evidências de intoxicação com três ou quatro doses, enquanto outras com o mesmo peso e história de consumo de álcool apresentam fala arrastada e incoordenação.

Abstinência (Critério 11) é uma síndrome que ocorre quando as concentrações de uma substância no sangue ou nos tecidos diminuem em um indivíduo que manteve uso intenso prolongado. Após desenvolver sintomas de abstinência, o indivíduo tende a consumir a substância para aliviá-los. Os sintomas de abstinência apresentam grande variação de uma classe de substâncias para outra, e conjuntos distintos de critérios para abstinência são fornecidos para as classes
de drogas. Sinais fisiológicos marcados e, geralmente, de fácil aferição são comuns com álcool, opioides e com sedativos, hipnóticos e ansiolíticos. Os sinais e sintomas de abstinência de estimulantes (anfetaminas e cocaína), bem como de tabaco e Cannabis, costumam estar presentes, mas são menos visíveis. Não foi documentada abstinência significativa em seres humanos após o uso repetido de fenciclidina, de outros alucinógenos e de inalantes; portanto, esse critério não foi incluído no caso dessas substâncias. Não são necessárias tolerância nem abstinência para um
diagnóstico de transtorno por uso de substância. Contudo, na maioria das classes de substâncias, história prévia de abstinência está associada a um curso clínico mais grave (i.e., início mais precoce de transtorno por uso de substância, níveis mais elevados de consumo de substância e uma quantidade maior de problemas relacionados a substâncias).

Sintomas de tolerância e abstinência que ocorrem durante o tratamento médico adequado com medicamentos receitados (p. ex., analgésicos opioides, sedativos, estimulantes) são especificamente desconsiderados ao se diagnosticar um transtorno por uso de substância. Houve casos em que o surgimento de tolerância farmacológica normal e esperada e de abstinência durante o curso de tratamento médico conduziu ao diagnóstico equivocado de “adição” mesmo quando estes eram os únicos sintomas presentes. Indivíduos cujos únicos sintomas são os decorrentes
de tratamento médico (i.e., tolerância e abstinência como parte de assistência médica quando os medicamentos são usados conforme prescritos) não devem ser diagnosticados unicamente com base nesses sintomas. Contudo, medicamentos com receita podem ser usados de forma inadequada, e pode-se diagnosticar corretamente um transtorno por uso de substância quando houver outros sintomas de comportamento compulsivo de busca por drogas.

Gravidade e Especificadores

Os transtornos por uso de substâncias ocorrem em uma ampla gama de gravidade, desde leve até grave, a qual se baseia na quantidade de critérios de sintomas confirmados. Em uma estimativa geral de gravidade, um transtorno por uso de substância leve é sugerido pela presença de dois ou três sintomas; moderado, por quatro ou cinco sintomas; e grave, por seis ou mais sintomas. A mudança da gravidade ao longo do tempo também reflete a redução ou o aumento na dose e/ou na frequência do uso da substância, conforme avaliação do relato do próprio indivíduo, do relato de outras pessoas cientes do caso, de observações do clínico e exames biológicos. Os especificadores do curso e os especificadores de características descritivas a seguir também estão disponíveis para os transtornos por uso de substâncias: “em remissão inicial”, “em remissão sustentada”, “em terapia de manutenção” e “em ambiente protegido”, e suas definições estão inseridas nos respectivos conjuntos de critérios.

Procedimentos para Registro para Transtornos por Uso de Substâncias

O clínico deve usar o código que se aplica à classe de substâncias, mas registrar o nome da substância específica. Por exemplo, o clínico deve registrar 304.10 (F13.20) transtorno por uso de alprazolam moderado (em vez de transtorno por uso de sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos moderado) ou 305.70 [F15.10] transtorno por uso de metanfetamina leve (em vez de transtorno por uso de estimulante leve). No caso de substâncias que não se encaixam em nenhuma das classes (p. ex., esteroides anabolizantes), o código adequado de “transtorno por uso de outra substância” deve ser usado, e a substância específica deve ser indicada (p. ex., 305.90 [F19.10] transtorno por uso de esteroide anabolizante leve). Se a substância consumida pelo indivíduo for desconhecida, o código para a classe “outra substância (ou substância desconhecida)” deve ser usado (p. ex., 304.90 [F19.20] transtorno por uso de substância desconhecida grave). Se os critérios forem satisfeitos para mais de um transtorno por uso de substância, todos eles devem ser diagnosticados (p. ex., 304.00 [F11.20] transtorno por uso de heroína grave; 304.20 [F14.20] transtorno por uso de cocaína moderado).

O código adequado da CID-10-MC para transtorno por uso de substância depende da presença de um transtorno induzido por substância comórbido (incluindo intoxicação e abstinência). No exemplo anterior, o código diagnóstico para transtorno por uso de alprazolam moderado, F13.20, reflete a ausência de transtorno mental induzido por alprazolam comórbido. Como os códigos da CID-10-MC para transtornos induzidos por substâncias indicam tanto a presença (ou ausência) quanto a gravidade do transtorno por uso de substância, os códigos da CID-10-MC para transtornos por uso de substâncias podem ser usados apenas na ausência de um transtorno induzido por substância. Consultar as seções próprias de substâncias específicas para mais informações sobre codificação.

Reparar que a palavra adição (= adicção) não é aplicada como termo diagnóstico nesta classificação, embora seja de uso comum em vários países para descrever problemas graves relacionados ao uso compulsivo e habitual de substâncias. O termo mais neutro transtorno por uso de substância é utilizado para descrever a ampla gama do transtorno, desde uma forma leve até um estado grave de recaídas crônicas de consumo compulsivo de drogas. Alguns clínicos podem preferir usar a palavra adição para descrever apresentações mais extremas, mas ela é omitida da terminologia diagnóstica dos transtornos por uso de substâncias do DSM-5 em razão de sua definição vaga e de sua conotação potencialmente negativa.

Transtornos Induzidos por Substâncias

A categoria geral de transtornos induzidos por substâncias inclui intoxicação, abstinência e outros transtornos mentais induzidos por substância/medicamento (p. ex., transtorno psicótico induzido por substância, transtorno depressivo induzido por substância).

Intoxicação e Abstinência de Substância

Os critérios para intoxicação por substância estão inclusos nas seções específicas para cada substância neste capítulo. Sua característica fundamental é o desenvolvimento de uma síndrome reversível específica de determinada substância que ocorreu devido a sua recente ingestão (Critério A). As mudanças comportamentais ou psicológicas clinicamente significativas associadas à intoxicação (p. ex., beligerância, labilidade do humor, julgamento prejudicado) são atribuíveis aos efeitos fisiológicos da substância sobre o sistema nervoso central e desenvolvem-se durante ou logo após o uso da substância (Critério B). Os sintomas não são atribuíveis a outra condição médica nem são mais bem explicados por outro transtorno mental (Critério D). A intoxicação por substância é comum entre pessoas com transtorno por uso de substância, mas também ocorre com frequência em indivíduos sem esse transtorno. Essa categoria não se aplica ao tabaco.

As alterações mais comuns decorrentes da intoxicação envolvem perturbações de percepção, vigília, atenção, pensamento, julgamento, comportamento psicomotor e comportamento interpessoal. As intoxicações breves, ou “agudas”, podem ter sinais e sintomas diferentes dos presentes nas intoxicações prolongadas, ou “crônicas”. Por exemplo, doses moderadas de cocaína podem, inicialmente, produzir sociabilidade, mas isolamento social pode se desenvolver caso essas doses sejam repetidas com frequência por dias ou semanas.

Quando usado no sentido fisiológico, o termo intoxicação é mais amplo do que intoxicação por substância tal como é definido aqui. Muitas substâncias podem produzir alterações fisiológicas ou psicológicas que não são, necessariamente, problema. Por exemplo, um indivíduo com taquicardia decorrente do uso de substância sofre um efeito fisiológico, mas se esse for o único sintoma na ausência de comportamento problemático, o diagnóstico de intoxicação não se aplica. A intoxicação pode, às vezes, persistir além do tempo durante o qual a substância é detectável no corpo, em decorrência de efeitos duradouros sobre o sistema nervoso central, cuja recuperação leva mais tempo do que a eliminação da substância. Esses efeitos mais prolongados da intoxicação devem ser diferenciados da abstinência (i.e., sintomas iniciados por um declínio nas concentrações de uma substância no sangue e nos tecidos).

Os critérios para abstinência de substância estão inclusos nas seções específicas para cada substância neste capítulo. A característica fundamental é o desenvolvimento de uma alteração comportamental problemática específica a determinada substância, com concomitantes fisiológicos e cognitivos, devido a interrupção ou redução do uso intenso e prolongado da substância (Critério A). A síndrome específica da substância causa sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo (Critério C). Os sintomas não se devem a uma condição médica geral nem são mais bem explicados por outro transtorno mental (Critério D). A abstinência geralmente, mas nem sempre, está associada a um transtorno por uso de substância. A maioria dos indivíduos com abstinência sente necessidade de readministrar a substância para reduzir os sintomas.

Via de Administração e Velocidade dos Efeitos da Substância

As vias de administração que produzem a absorção mais rápida e eficiente na corrente sanguínea (p. ex., intravenosa, fumada, “cheirada”) tendem a resultar em uma intoxicação mais intensa e em uma probabilidade maior de um padrão progressivo de uso da substância, levando à abstinência. De modo semelhante, substâncias de ação rápida têm maior probabilidade de produzir intoxicação imediata do que aquelas de ação mais lenta.

Duração dos Efeitos

Em uma mesma categoria de drogas, as substâncias de ação relativamente curta tendem a ter um potencial mais alto para o desenvolvimento de abstinência do que aquelas de duração mais prolongada. Contudo, substâncias de ação mais prolongada tendem a apresentar abstinência de maior duração. A meia-vida da substância tem paralelos com os aspectos da abstinência: quanto mais prolongada a duração da ação, mais tempo entre a interrupção e o início dos sintomas de abstinência e maior a duração da abstinência. De modo geral, quanto maior o período agudo de abstinência, menos intensa tende a ser a síndrome.

Uso de Múltiplas Substâncias

A intoxicação e a abstinência de substâncias geralmente envolvem várias substâncias utilizadas simultânea ou sequencialmente. Nesses casos, cada diagnóstico deve ser registrado de forma separada.

Achados Laboratoriais Associados

Análises laboratoriais de amostras de sangue e urina podem ajudar a determinar o uso recente e o tipo específico de substância. Contudo, um resultado laboratorial positivo não indica, por si só, a existência de um padrão de uso de substância que satisfaça os critérios para um transtorno induzido por substância ou um transtorno por uso de substância, e um resultado negativo, por si só, não descarta o diagnóstico.

Os testes laboratoriais podem ser úteis para identificar abstinência. Caso o indivíduo se apresente com abstinência de uma substância desconhecida, os testes laboratoriais podem ajudar a identificá-la e também podem ser úteis para diferenciar abstinência de outros transtornos mentais. Além disso, o funcionamento normal na presença de níveis sanguíneos elevados de uma substância sugere tolerância considerável.

Desenvolvimento e Curso

Indivíduos entre 18 e 24 anos apresentam taxas de prevalência relativamente altas para o uso de praticamente todas as substâncias. A intoxicação costuma ser o primeiro transtorno relacionado a substâncias e frequentemente se inicia na adolescência. A abstinência pode ocorrer em qualquer idade, contanto que a droga relevante tenha sido consumida em doses suficientes ao longo de um período de tempo prolongado.

Procedimentos para Registro para Intoxicação e Abstinência

O clínico deve usar o código que se aplica à classe de substâncias, mas registrar o nome da substância específica. Por exemplo, o clínico deve registrar 292.0 (F13.239) abstinência de secobarbital (em vez de abstinência de sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos) ou 292.89 (F15.129) intoxicação por anfetamina (em vez de intoxicação por estimulante). Reparar que o código adequado da CID-10-MC para intoxicação depende de haver um transtorno por uso de substância comórbido. Nesse caso, o código F15.129 para metanfetamina indica a presença de um transtorno por uso de metanfetamina leve comórbido. Caso não houvesse transtorno por uso de metanfetamina comórbido, o código diagnóstico teria sido F15.929. As regras de codificação da CID-10-MC exigem que todos os códigos de abstinência indiquem um transtorno por uso de substância comórbido de moderado a grave para aquela substância. No caso anterior, o código para abstinência de secobarbital (F13.239) indica a presença comórbida de um transtorno por uso de secobarbital moderado. Ver a nota para codificação para intoxicação e para síndrome de abstinência de cada substância para as opções de codificação.

No caso de substâncias que não se encaixam em nenhuma das classes (p. ex., esteroides anabolizantes), o código adequado para “intoxicação por outra substância” deve ser usado, e a substância específica deve ser indicada (p. ex., 292.89 [F19.929] intoxicação por esteroide anabolizante).

Caso a substância consumida pelo indivíduo seja desconhecida, o código para a classe “outra substância (ou substância desconhecida)” deve ser usado (p. ex., 292.89 [F19.929] intoxicação por substância desconhecida). Se houver sintomas ou problemas associados a uma substância em particular, mas os critérios não forem satisfeitos para nenhum dos transtornos relacionados a substâncias específicas, pode-se usar a categoria não especificado (p. ex., 292.9 [F12.99] transtorno relacionado a Cannabis não especificado).

Conforme indicado, os códigos relacionados a substâncias na CID-10-MC combinam o aspecto de transtorno por uso de substância do quadro clínico e o aspecto induzido por substância em um único código. Portanto, caso estejam presentes tanto abstinência de heroína como transtorno por uso de heroína moderado, o código único F11.23 é fornecido para cobrir as duas apresentações. Na CID-9-MC, códigos diagnósticos distintos (292.0 e 304.00) são fornecidos, respectivamente para indicar a abstinência e o transtorno por uso de heroína moderado. Consulte as
seções específicas de cada substância para mais informações sobre codificação.