Transtorno Bipolar Tipo 2 – Critérios Diagnósticos – DSM-5
Neste post apresentamos o texto completo com os critérios diagnósticos, definição clínica, evolução e prognóstico do Transtorno Bipolar Tipo 2 de acordo com o DSM-5.
A definição clínica e critérios diagnósticos para o Transtorno Bipolar Tipo 1 de acordo com o DSM-V também pode ser acessado no portal.
Para aprofundar seu estudo leia nosso artigo básico sobre o Transtorno Afetivo Bipolar aqui.
A definição clínica de acordo com a CID10 também está disponível no portal.
Índice
Critérios Diagnósticos – Transtorno Bipolar Tipo 2
A. Foram atendidos os critérios para pelo menos um episódio hipomaníaco (Critérios A-F em “Episódio Hipomaníaco” descritos na sequência).
B. Jamais houve um episódio maníaco.
C. A ocorrência do(s) episódio(s) hipomaníaco(s) e depressivo(s) maior(es) não é mais bem explicada por transtorno esquizoafetivo, esquizofrenia, transtorno esquizofreniforme, transtorno delirante, outro transtorno do espectro da esquizofrenia e outro transtorno psicótico especificado ou transtorno do espectro da esquizofrenia e outro transtorno psicótico não especificado.
D. Os sintomas de depressão ou a imprevisibilidade causada por alternância frequente entre períodos de depressão e hipomania causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outra área importante da vida do indivíduo.
Episódio Hipomaníaco
A. Um período distinto de humor anormal e persistentemente elevado, expansivo ou irritável e aumento anormal e persistente da atividade ou energia, com duração de pelo menos quatro dias consecutivos e presente na maior parte do dia, quase todos os dias.
B. Durante o período de perturbação do humor e aumento da energia e atividade, três (ou mais) dos seguintes sintomas (quatro se o humor é apenas irritável) persistem, representam uma mudança notável em relação ao comportamento habitual e estão presentes em grau significativo:
- Autoestima inflada ou grandiosidade.
- Redução da necessidade de sono (p. ex., sente-se descansado com apenas três horas de sono).
- Mais loquaz que o habitual ou pressão para continuar falando.
- Fuga de ideias ou experiência subjetiva de que os pensamentos estão acelerados.
- Distratibilidade (i.e., a atenção é desviada muito facilmente por estímulos externos insignificantes ou irrelevantes), conforme relatado ou observado.
- Aumento da atividade dirigida a objetivos (seja socialmente, no trabalho ou escola, seja sexualmente) ou agitação psicomotora.
- Envolvimento excessivo em atividades com elevado potencial para consequências dolorosas (p. ex., envolvimento em surtos desenfreados de compras, indiscrições sexuais ou investimentos financeiros insensatos).
C. O episódio está associado a uma mudança clara no funcionamento que não é característica do indivíduo quando assintomático.
D. A perturbação no humor e a mudança no funcionamento são observáveis por outras pessoas.
E. O episódio não é suficientemente grave a ponto de causar prejuízo acentuado no funcionamento social ou profissional ou para necessitar de hospitalização. Existindo características psicóticas, por definição, o episódio é maníaco.
F. O episódio não é atribuível aos efeitos fisiológicos de uma substância (p. ex., droga de abuso, medicamento ou outro tratamento).
Nota: Um episódio hipomaníaco completo que surge durante tratamento antidepressivo (p. ex., medicamento, eletroconvulsoterapia), mas que persiste em um nível de sinais e sintomas além do efeito fisiológico desse tratamento, é evidência suficiente para um diagnóstico de episódio hipomaníaco.
Recomenda-se, porém, cautela para que 1 ou 2 sintomas (principalmente aumento da irritabilidade, nervosismo ou agitação após uso de antidepressivo) não sejam considerados suficientes para o diagnóstico de episódio hipomaníaco nem necessariamente indicativos de uma diátese bipolar.
Episódio Depressivo Maior
A. Cinco (ou mais) dos seguintes sintomas estiveram presentes durante o mesmo período de duas semanas e representam uma mudança em relação ao funcionamento anterior; pelo menos um dos sintomas é (1) humor deprimido ou (2) perda de interesse ou prazer.
Nota: Não incluir sintomas que sejam claramente atribuíveis a outra condição médica.
- Humor deprimido na maior parte do dia, quase todos os dias, conforme indicado por relato subjetivo (p. ex., sente-se triste, vazio ou sem esperança) ou por observação feita por outra pessoa (p. ex., parece choroso). (Nota: Em crianças e adolescentes, pode ser humor irritável.)
- Acentuada diminuição de interesse ou prazer em todas, ou quase todas, as atividades na maior parte do dia, quase todos os dias (conforme indicado por relato subjetivo ou observação).
- Perda ou ganho significativo de peso sem estar fazendo dieta (p. ex., mudança de mais de 5% do peso corporal em um mês) ou redução ou aumento no apetite quase todos os dias. (Nota: Em crianças, considerar o insucesso em obter o peso esperado.)
- Insônia ou hipersonia quase diária.
- Agitação ou retardo psicomotor quase todos os dias (observável por outras pessoas; não meramente sensações subjetivas de inquietação ou de estar mais lento).
- Fadiga ou perda de energia quase todos os dias.
- Sentimentos de inutilidade ou culpa excessiva ou inapropriada (que podem ser delirantes) quase todos os dias (não meramente autorrecriminação ou culpa por estar doente).
- Capacidade diminuída para pensar ou se concentrar, ou indecisão quase todos os dias (por relato subjetivo ou observação feita por outra pessoa).
- Pensamentos recorrentes de morte (não somente medo de morrer), ideação suicida recorrente sem um plano específico, tentativa de suicídio ou plano específico para cometer suicídio.
B. Os sintomas causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo.
C. O episódio não é atribuível aos efeitos fisiológicos de uma substância ou outra condição médica.
Nota: Os Critérios A-C representam um episódio depressivo maior.
Nota: Respostas a uma perda significativa (p. ex., luto, ruína financeira, perdas por desastre natural, doença médica grave ou incapacidade) podem incluir sentimentos de tristeza intensos, ruminação acerca da perda, insônia, falta de apetite e perda de peso observados no Critério A, que podem se assemelhar a um episódio depressivo. Embora tais sintomas possam ser entendidos ou considerados apropriados à perda, a presença de um episódio depressivo maior, além da resposta normal a uma perda significativa, deve ser também cuidadosamente considerada. Essa decisão exige inevitavelmente exercício de juízo clínico, baseado na história do indivíduo e nas normas culturais para a expressão de sofrimento no contexto de uma perda.
Ao diferenciar luto de um EDM, é útil considerar que, no luto, o afeto predominante inclui sentimentos de vazio e perda, enquanto no EDM há humor deprimido persistente e incapacidade de antecipar felicidade ou prazer. A disforia no luto pode diminuir de intensidade ao longo de dias a semanas, ocorrendo em ondas, conhecidas como “dores do luto”. Essas ondas tendem a estar associadas a pensamentos ou lembranças do falecido. O humor deprimido de um EDM é mais persistente e não está ligado a pensamentos ou preocupações específicos. A dor do luto pode vir acompanhada de emoções e humor positivos que não são característicos da infelicidade e angústia generalizadas de um EDM. O conteúdo do pensamento associado ao luto geralmente apresenta preocupação com pensamentos e lembranças do falecido, em vez das ruminações autocríticas ou pessimistas encontradas no EDM. No luto, a autoestima costuma estar preservada, ao passo que no EDM sentimentos de desvalia e aversão a si mesmo são comuns. Se presente no luto, a ideação autodepreciativa tipicamente envolve a percepção de falhas em relação ao falecido (p. ex., não ter feito visitas com frequência suficiente, não dizer ao falecido o quanto o amava). Se um indivíduo enlutado pensa em morte e em morrer, tais pensamentos costumam ter o foco no falecido e possivelmente em “se unir” a ele, enquanto no EDM esses pensamentos têm o foco em acabar com a própria vida em razão dos sentimentos de desvalia, de não merecer estar vivo ou da incapacidade de enfrentar a dor da depressão.
Características Diagnósticas do Transtorno Bipolar Tipo 2
O transtorno bipolar tipo 2 caracteriza-se por um curso clínico de episódios de humor recorrentes, consistindo em um ou mais episódios depressivos maiores (Critérios A-C em “Episódio Depressivo Maior”) e pelo menos um episódio hipomaníaco (Critérios A-F em “Episódio Hipomaníaco”).
O episódio depressivo maior deve ter duração de pelo menos duas semanas, e o hipomaníaco, de, no mínimo, quatro dias, para que sejam satisfeitos os critérios diagnósticos.
Durante o(s) episódio(s) de humor, a quantidade necessária de sintomas deve estar presente na maior parte do dia, quase todos os dias, além de os sintomas representarem uma mudança notável do comportamento e do funcionamento habituais.
A presença de um episódio maníaco durante o curso da doença exclui o diagnóstico de transtorno bipolar tipo 2 (Critério B em “Transtorno Bipolar tipo 2”).
Episódios de transtorno depressivo induzido por substância/medicamento ou de transtorno bipolar e transtorno relacionado induzido por substância/medicamento (devido aos efeitos fisiológicos de um fármaco, outros tratamentos somáticos para depressão, drogas de abuso ou exposição a toxina) ou transtorno depressivo e transtorno relacionado devido a outra condição médica ou transtorno bipolar e transtorno relacionado devido a outra condição médica não contam para o diagnóstico de transtorno bipolar tipo 2, a menos que persistam além dos efeitos fisiológicos do tratamento ou da substância e atendam aos critérios de duração para um episódio.
Além disso, os episódios não devem ser mais bem explicados por transtorno esquizoafetivo, não estando sobreposto à esquizofrenia, ao transtorno esquizofreniforme, ao transtorno delirante ou a outro transtorno do espectro da esquizofrenia ou outros transtornos psicóticos especificado ou ao transtorno do espectro esquizofrenia e outros transtornos psicóticos não especificado (Critério C em “Transtorno Bipolar tipo 2”).
Os episódios depressivos ou as oscilações hipomaníacas devem causar sofrimento ou prejuízo clinicamente significativo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo (Critério D em “Transtorno Bipolar tipo 2”); para episódios hipomaníacos, porém, essa exigência não precisa ser atendida.
Um episódio hipomaníaco que causa prejuízo significativo poderia ser diagnosticado como episódio maníaco e diagnóstico de transtorno bipolar tipo I ao longo da vida. Os episódios depressivos maiores recorrentes costumam ser mais frequentes e prolongados do que os que ocorrem no transtorno bipolar tipo 1.
Pessoas com transtorno bipolar tipo 2 normalmente se apresentam ao clínico durante um episódio depressivo maior, sendo improvável que se queixem inicialmente de hipomania.
Em geral, os episódios hipomaníacos não causam prejuízo por si mesmos.
Em vez disso, o prejuízo é consequência dos episódios depressivos maiores ou do padrão persistente de mudanças e oscilações imprevisíveis de humor e da instabilidade do funcionamento interpessoal ou profissional. Os indivíduos com transtorno bipolar tipo II podem não encarar os episódios hipomaníacos como patológicos ou prejudiciais, embora outras pessoas possam se sentir perturbadas por seu comportamento errático. Informações clínicas dadas por outras pessoas, como amigos mais próximos ou parentes, costumam ser úteis para o estabelecimento de um diagnóstico de transtorno bipolar tipo II.
Um episódio hipomaníaco não deve ser confundido com os vários dias de eutimia e de restauração da energia ou da atividade que podem vir após a remissão de um episódio depressivo maior.
Apesar das diferenças substanciais na duração e na gravidade entre um episódio maníaco e um hipomaníaco, o transtorno bipolar tipo 2 não representa uma “forma mais leve” do transtorno bipolar tipo 1.
Comparados com indivíduos com transtorno bipolar tipo 1, os que apresentam transtorno bipolar tipo 2 têm maior cronicidade da doença e passam, em média, mais tempo na fase depressiva, que pode ser grave e/ou incapacitante.
Sintomas depressivos durante um episódio hipomaníaco ou sintomas hipomaníacos durante um episódio depressivo são comuns em indivíduos com transtorno bipolar tipo 2 e são mais comuns no sexo feminino, especialmente hipomania com características mistas.
Indivíduos com hipomania com características mistas podem não caracterizar seus sintomas como hipomania, experimentando-os como depressão com aumento de energia ou irritabilidade.
Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico
Uma característica comum do transtorno bipolar tipo 2 é a impulsividade, que pode contribuir com tentativas de suicídio e transtornos por uso de substância.
A impulsividade pode também se originar de um transtorno da personalidade comórbido, transtorno por uso de substância, transtorno de ansiedade, outro transtorno mental ou uma condição médica.
Pode haver níveis aumentados de criatividade em alguns indivíduos com transtorno bipolar.
A relação pode ser, no entanto, não linear; isto é, grandes realizações criativas na vida têm sido associadas a formas mais leves de transtorno bipolar, e criatividade superior foi identificada em familiares não afetados.
A satisfação que o indivíduo tem com a criatividade aumentada durante episódios hipomaníacos pode contribuir para ambivalência quanto a buscar tratamento ou prejudicar a adesão a ele.
Prevalência
A prevalência em 12 meses do transtorno bipolar tipo 2, internacionalmente, é de 0,3%. Nos Estados Unidos, a prevalência em 12 meses é de 0,8%. A taxa de prevalência do transtorno bipolar tipo 2 pediátrico é difícil de estabelecer. No DSM-IV, transtornos bipolar tipo 1, bipolar tipo 2 e bipolar sem outras especificações resultaram em uma taxa de prevalência combinada de 1,8% em amostras de comunidades nos Estados Unidos e fora do país, com taxas superiores (2,7% inclusive) em jovens com 12 anos de idade ou mais.
Desenvolvimento e Curso
Embora o transtorno bipolar tipo 2 possa começar no fim da adolescência e durante a fase adulta, a idade média de início situa-se por volta dos 25 anos, o que é um pouco mais tarde em comparação ao transtorno bipolar tipo 1 e mais cedo em comparação ao transtorno depressivo maior.
Normalmente, a doença inicia com um episódio depressivo e não é reconhecida como transtorno bipolar tipo 2 até o surgimento de um episódio hipomaníaco, o que acontece em cerca de 12% das pessoas com diagnóstico inicial de transtorno depressivo maior.
Transtorno de ansiedade, por uso de substância ou transtorno alimentar podem também anteceder o diagnóstico, complicando sua detecção.
Muitos indivíduos têm vários episódios de depressão maior antes da identificação do primeiro episódio hipomaníaco.
A quantidade de episódios na vida (hipomaníacos e depressivos maiores) tende a ser superior para transtorno bipolar tipo 2 em comparação a transtorno depressivo maior ou transtorno bipolar tipo I. No entanto, indivíduos com transtorno bipolar 1 estão, na realidade, mais propensos a ter sintomas hipomaníacos do que aqueles com transtorno bipolar tipo 2. O intervalo entre episódios de humor, no curso de um transtorno bipolar tipo 2, tende a diminuir com o envelhecimento.
Enquanto o episódio hipomaníaco é a característica que define o transtorno bipolar tipo 2, os episódios depressivos são mais duradouros e incapacitantes ao longo do tempo. Apesar do predomínio da depressão, ocorrido um episódio hipomaníaco, o diagnóstico passa a transtorno bipolar tipo II e jamais se reverte para transtorno depressivo maior.
Aproximadamente 5 a 15% dos indivíduos com transtorno bipolar tipo II têm múltiplos (quatro ou mais) episódios de humor (hipomaníaco ou depressivo maior) nos 12 meses anteriores. Quando presente, esse padrão é registrado pelo especificador “com ciclagem rápida”. Por definição, sintomas psicóticos não ocorrem em episódios hipomaníacos e parecem ser menos frequentes em episódios depressivos maiores do transtorno bipolar tipo II do que nos do transtorno bipolar tipo I.
Mudança de um episódio depressivo para um maníaco ou hipomaníaco (com ou sem características mistas) pode ocorrer tanto espontaneamente como durante o tratamento para depressão. Cerca de 5 a 15% dos indivíduos com transtorno bipolar tipo II acabam por desenvolver um episódio maníaco, o que muda o diagnóstico para transtorno bipolar tipo 1, independentemente do curso posterior.
Costuma ser um desafio fazer o diagnóstico em crianças, sobretudo naquelas com irritabilidade e hiperexcitabilidade não episódicas (i.e., ausência de períodos bem delimitados de humor alterado). Irritabilidade não episódica nos jovens está associada a risco elevado para transtornos de ansiedade e transtorno depressivo maior, mas não transtorno bipolar, na vida adulta.
Jovens persistentemente irritáveis têm taxas familiares inferiores de transtorno bipolar, na comparação com jovens com transtorno bipolar.
Para o diagnóstico de um episódio hipomaníaco, os sintomas da criança devem exceder o esperado em determinado ambiente e cultura para seu estágio de desenvolvimento.
Comparado ao início no adulto, o início do transtorno bipolar tipo II na infância ou na adolescência pode estar associado a um curso mais grave ao longo da vida.
A taxa de incidência em três anos do início do transtorno bipolar tipo II em adultos com mais de 60 anos é de 0,34%.
No entanto, distinguir indivíduos com mais de 60 anos com transtorno bipolar tipo II de início precoce ou tardio não parece ter qualquer utilidade clínica.
Fatores de Risco e Prognóstico
Genéticos e fisiológicos. O risco de transtorno bipolar tipo 2 tende a ser mais elevado entre parentes de pessoas com essa condição, em oposição a pessoas com transtorno bipolar tipo 1 ou transtorno depressivo maior. Pode haver fatores genéticos influenciando a idade do início de transtornos bipolares.
Modificadores do curso. Um padrão de ciclagem rápida está associado a pior prognóstico. O retorno a um nível prévio de funcionamento social para pessoas com transtorno bipolar tipo II é mais provável para indivíduos mais jovens e com depressão menos grave, sugerindo efeitos adversos da doença prolongada na recuperação. Mais educação, menos anos da doença e estar casado têm associação independente com a recuperação funcional em indivíduos com transtorno bipolar, mesmo depois de ser levado em conta o tipo de diagnóstico (I vs. II), os sintomas depressivos atuais e a presença de comorbidade psiquiátrica.
Questões Diagnósticas Relativas ao Gênero
Enquanto a proporção de gênero para transtorno bipolar tipo I é igual, os achados sobre diferenças de gênero no transtorno bipolar tipo II são mistos, diferindo pelo tipo de amostra (i.e., registro, comunidade ou clínico) e país de origem. Há pouca ou nenhuma evidência de diferenças de gênero em indivíduos bipolares, enquanto algumas amostras clínicas, mas não todas, sugerem que o transtorno bipolar tipo II é mais comum no sexo feminino do que no masculino, o que pode refletir diferenças de gênero na busca de tratamento ou outros fatores.
Padrões de doença e comorbidade, porém, parecem diferir por gênero, com indivíduos do sexo feminino apresentando mais probabilidade do que os do sexo masculino de relatar hipomania com características mistas depressivas e um curso de ciclagem rápida. O parto pode ser um desencadeador específico para um episódio hipomaníaco, o que pode ocorrer em 10 a 20% das mulheres em populações não clínicas, mais comumente no começo do período pós-parto. Diferenciar hipomania de humor eufórico e sono reduzido, que costumam acompanhar o nascimento de um filho, pode ser um desafio. A hipomania pós-parto pode prenunciar o início de uma depressão que ocorre em cerca de metade das mulheres que apresentam “euforia” pós-parto. Uma detecção precisa de transtorno bipolar tipo II pode ajudar a estabelecer o tratamento adequado da depressão, capaz de reduzir o risco de suicídio e infanticídio.
Risco de Suicídio no Transtorno Bipolar Tipo 2
É elevado o risco de suicídio no transtorno bipolar tipo II. Cerca de um terço dos indivíduos como transtorno relata história de tentativa de suicídio ao longo da vida. As taxas de prevalência desuicídios tentados durante a vida, nos transtornos bipolar tipo 1 e tipo 2, parecem assemelhar-se (32,4 e 36,3%, respectivamente). A letalidade das tentativas, entretanto, definida por uma proporção menor de tentativas até suicídios consumados, pode ser maior em indivíduos com transtorno bipolar tipo II comparados àqueles com transtorno bipolar tipo I. Pode existir associação entre marcadores genéticos e risco aumentado de comportamento suicida em indivíduos com transtorno bipolar, incluindo risco 6,5 vezes maior de suicídio entre parentes de primeiro grau de probandos com transtorno bipolar tipo 2 comparados aos com transtorno bipolar tipo I.
Consequências Funcionais do Transtorno Bipolar Tipo II
Embora muitas pessoas com transtorno bipolar tipo II voltem a um nível totalmente funcional entre os episódios de humor, pelo menos 15% continuam a ter alguma disfunção entre os episódios, e 20% mudam diretamente para outro episódio de humor sem recuperação entre episódios. A recuperação funcional está muito aquém da recuperação dos sintomas do transtorno bipolar tipo II, especialmente no que diz respeito à recuperação profissional, resultando em condição socioeconômica mais baixa apesar de níveis equivalentes de educação em comparação com a população em geral. Indivíduos com transtorno bipolar tipo II têm desempenho inferior ao daqueles saudáveis em testes cognitivos e, exceto em memória e fluência semântica, têm prejuízo cognitivo similar ao de pessoas com transtorno bipolar tipo I. Os prejuízos cognitivos associados ao transtorno bipolar tipo II podem contribuir para dificuldades no trabalho. Desemprego prolongado em indivíduos com transtorno bipolar está associado a mais episódios de depressão, idade mais avançada, taxas maiores de transtorno de pânico atual e história de transtorno por uso de álcool ao longo da vida.
Diagnóstico Diferencial
Transtorno depressivo maior. Talvez o diagnóstico diferencial mais desafiador a ser considerado é o de transtorno depressivo maior, que pode estar acompanhado de sintomas hipomaníacos ou maníacos que não satisfazem a totalidade dos critérios (i.e., menos sintomas ou menor duração que o necessário para um episódio hipomaníaco). Isso é especialmente verdadeiro na avaliação de pessoas com sintomas de irritabilidade, que podem estar associados a transtorno depressivo maior ou a transtorno bipolar tipo II.
Transtorno ciclotímico. No transtorno ciclotímico, há vários períodos de sintomas hipomaníacos e inúmeros períodos de sintomas depressivos que não atendem aos critérios de números de sintomas ou de duração para episódio depressivo maior. O transtorno bipolar tipo II é diferente do transtorno ciclotímico pela presença de um ou mais episódios depressivos. Quando ocorre um episódio depressivo maior após os dois primeiros anos de transtorno ciclotímico, é estabelecido o diagnóstico adicional de transtorno bipolar tipo 2.
Transtornos do espectro da esquizofrenia e outros transtornos psicóticos relacionados. O transtorno bipolar tipo II deve ser diferenciado de transtornos psicóticos (p. ex., transtornoesquizoafetivo, esquizofrenia e transtorno delirante). Esquizofrenia, transtorno esquizoafetivoe transtorno delirante são todos caracterizados por períodos de sintomas psicóticos queocorrem na ausência de sintomas acentuados de humor. Outras considerações úteis incluem ossintomas associados, o curso anterior e a história familiar.
Transtorno de pânico e outros transtornos de ansiedade. Transtornos de ansiedade precisam ser levados em conta no diagnóstico diferencial e podem, com frequência, estar presentes como transtornos comórbidos.
Transtornos por uso de substância. Transtornos por uso de substância fazem parte do diagnóstico diferencial.
Transtorno de déficit de atenção/hiperatividade. Transtorno de déficit de atenção/hiperatividade pode ser diagnosticado erroneamente como transtorno bipolar tipo 2, sobretudo em adolescentes e crianças. Muitos sintomas de TDAH, como rapidez da fala, velocidade dos pensamentos, distratibilidade e menor necessidade de sono, sobrepõem-se aos de hipomania. A “dupla contagem” de sintomas para TDAH e transtorno bipolar tipo II pode ser evitada se o clínico esclarecer se os sintomas representam um episódio distinto e se o aumento notável em relação ao comportamento habitual do indivíduo, necessário para o diagnóstico de transtorno bipolar tipo II, está presente.
Transtornos da personalidade. A mesma convenção aplicada para o TDAH vale para a avaliação de um indivíduo para transtorno da personalidade, como o transtorno da personalidade borderline, uma vez que a oscilação do humor e a impulsividade são comuns nos transtornos da personalidade e no transtorno bipolar tipo II. Os sintomas devem representar um episódio distinto, e o aumento notável em relação ao comportamento habitual do indivíduo, necessário para o diagnóstico de transtorno bipolar tipo II, deve estar presente. Não deve ser feito diagnóstico de transtorno da personalidade durante episódio não tratado de humor, a não ser que a história de vida apoie a presença de um transtorno da personalidade.
Outros transtornos bipolares. Diagnóstico de transtorno bipolar tipo 2 deve ser diferenciado de transtorno bipolar tipo 1 pela avaliação criteriosa quanto a ter havido ou não episódios passados de mania. Deve ser diferenciado de outro transtorno bipolar e transtornos relacionados especificado ou transtorno bipolar e transtorno relacionado não especificado pela confirmação da presença de episódios completos de hipomania e depressão.
Comorbidades do Transtorno Bipolar Tipo 2
O transtorno bipolar tipo II é associado, com muita frequência, a um ou mais de um transtorno mental comórbido, sendo os transtornos de ansiedade os mais comuns. Cerca de 60% das pessoas com transtorno bipolar tipo II têm três ou mais transtornos mentais comórbidos; 75% têm transtorno de ansiedade; e 37%, transtorno por uso de substância. Crianças e adolescentes com transtorno bipolar tipo II têm uma taxa superior de transtornos de ansiedade comórbidos comparados àqueles com transtorno bipolar tipo I, e o transtorno de ansiedade ocorre mais frequentemente antes do transtorno bipolar. Transtorno de ansiedade e transtornos por uso de substâncias ocorrem em indivíduos com transtorno bipolar tipo II em proporção mais alta do que na população em geral. Cerca de 14% das pessoas com transtorno bipolar tipo II têm pelo menos um transtorno alimentar ao longo da vida, com o transtorno de compulsão alimentar sendo mais comum que a bulimia nervosa e a anorexia nervosa.
Esses transtornos comórbidos geralmente parecem não seguir um curso que seja realmente independente daquele do transtorno bipolar; têm, isto sim, fortes associações com os estados de humor. Por exemplo, transtornos de ansiedade e transtornos alimentares tendem a associar-se mais com sintomas depressivos, e transtornos por uso de substâncias estão moderadamente associados a sintomas maníacos.
(fonte: DSM-5)