Telepsiquiatria – A Telemedicina como ferramenta de enfrentamento da pandemia Covid19
Panorama e História Recente
Até muito recentemente a única regulação da Telemedicina no Brasil era a Resolução do Conselho Federal de Medicina CFM no. 1643/2002, um texto bastante restritivo, que praticamente só admitia a possibilidade de teleatendimento na presença de médicos “nas duas pontas” (um ao lado do paciente, e o outro a distância).
Houve uma tentativa de modernização em 2019 com a Resolução CFM no. 2227/2018, frustrada pela mobilização de boa parte das entidades representativas médicas.
Na época, foi denunciado que diversos convênios e empresas já preparavam a oferta de teleatendimentos a preços ainda inferiores aos pagos pelas consultas presenciais, sem nenhuma possibilidade de controle da qualidade da assistência que seria oferecida, colocando os interesses financeiros como objetivo único.
Mudanças Aceleradas pela Pandemia (COVID19)
Essa resistência da Medicina brasileira à Telemedicina, ainda que justa, interrompeu um processo que poderia já ter previsto situações de exceção, como o atual – e acabou por permitir que os Poderes Executivo e Legislativo assumissem o controle sobre a conduta médica, sem serem possuidores do saber médico.
Vejam que ao promulgar a Lei 13.989/2020 o Poder Executivo vetou o Artigo 6o que determinava que caberia ao Conselho Federal de Medicina regulamentar tal modalidade de assistência médica em definitivo após o controle da pandemia. Justifica o veto declarando que a regulamentação caberá novamente aos representantes eleitos, ainda que não possuidores do conhecimento técnico necessário.
Enfrentando diversas medidas de distanciamento / isolamento social destinadas a restringir a circulação da população numa tentativa de frear a disseminação de casos de COVID19, o Ministério da Saúde publicou a Portaria no.467/2020 e logo na sequência foi promulgada referida Lei, regulamentando a Telemedicina “enquanto durar a crise ocasionada pelo coronavírus (SARS-CoV-2)”.
Importância no Cenário Atual
Ganha destaque em tempos de pandemia, sendo reconhecida como uma ferramenta de enfrentamento importante (basta considerar o tempo curtíssimo de tramitação do Projeto de Lei até sua aprovação).
Permite por um lado desafogar os centros médicos, oferecendo avaliação e triagem domiciliar para síndromes respiratórias e casos suspeitos de CODID19.
E por outro a manutenção de tratamentos de doenças crônicas sem prejuízo e sem o risco de exposição ao vírus para os pacientes, sendo esta última a função que nos interessa na Psiquiatria.
Limitações
É importante destacar: nenhuma tecnologia disponível atualmente substitui o exame físico especializado presencial – chamado exame psíquico no caso da clínica psiquiátrica.
Independente da resolução da imagem e qualidade de áudio, o exame das funções psíquicas fica limitado pela distância entre o médico e o paciente.
Por isso entendemos que, em especial as primeiras consultas, mas também os atendimentos de urgências e descompensações psiquiátricas, só deveriam ser realizados à distância quando absolutamente inviável a forma presencial.
Nossa Rotina
Ainda que se perca em qualidade, não existiria impedimento para atendimentos e consultas de rotina dos casos já conhecidos pelo Médico responsável, ao menos enquanto persistirem as medidas de isolamento social.
Em grupos de discussão de especialistas em Saúde Mental verificamos que nossas condutas se coadunam com a da maior parte dos colegas.
O 1o atendimento em regra deve ser presencial. Lembramos ao paciente (e anotamos em prontuário!) as limitações óbvias deste método de atendimento. Solicitamos contato eletrônico ou telefônico em período mais breve para nos certificarmos da resposta a terapêutica proposta. E encaminhamos as receitas assinadas eletronicamente.
Receitas Eletrônicas?
Nos deparamos então com a questão das receitas médicas.
O objetivo das várias medidas de enfrentamento da pandemia é reduzir a circulação de pessoas. Regulamenta-se a Telemedicina em caráter excepcional e em ritmo de urgência para tanto.
O paciente consegue ser atendido a distância, mas ainda precisaria se deslocar até o consultório para retirar as receitas, e depois até uma farmácia para comprar os remédios prescritos – um contra-senso! Mesmo o deslocamento até a farmácia poderia (e deveria!) ser evitado neste período, bastando que fossem autorizadas as televendas de medicamentos controlados .
Apesar da Medida Provisória 2.200-2 já em 2001 ter determinado a validade jurídica de documentos assinados por certificados digitais ICP-Brasil, somente agora as farmácias começaram a se adequar a legislação, aceitando receitas assinadas desta forma.
Infelizmente ainda não se desenvolveu um sistema oficial de prescrição eletrônica que permita o controle adequado da dispensação das receitas, e as receitas que requerem notificação (receitas “azuis” e “amarelas”) continuam só sendo aceitas em sua via física portanto.
A conferência da validade do documento deveria ser online, bastando abrir a versão digital original do documento em qualquer leitor de PDF. Mas nesta fase de adaptação e treinamento das farmácias, a receita impressa, em papel, ainda é muitas vezes requisitada – após algumas dificuldades pontuais, criamos um QR-Code que vai “carimbado” nas receitas, e que direciona para a receita digital em sua original.
Conclusão
Esperamos que lições sejam aprendidas dessa calamidade sanitária – que não tenhamos que aguardar a próxima pandemia para modernizar a assistência médica e farmacêutica no país!